*Texto publicado em http://www.piccininiserrano.com.br/direitos-autorais-e-a-fotografia-na-constancia-de-relacao-de-trabalho/
De acordo com o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o fotógrafo contratado para registrar festividades ou eventos não é titular dos direitos autorais das fotografias colhidas, uma vez que apenas cumpriu ordens e prestou os serviços para os quais foi contratado.
Com este entendimento, o TJ/MG, através de sua 10ª Câmara Cível, negou provimento ao recurso de apelação do fotógrafo, Valmir da Silva, que pedia a condenação do músico, Marcos Viana, e da empresa, Sonhos e Sons Ltda., pela utilização de fotografias de sua autoria em três encartes de CDs, sem os devidos créditos [1].
No caso dos autos, o fotógrafo Valmir foi contratado, e recebeu remuneração, para cobrir dois eventos realizados pelo estúdio de dança, “Brigitte Bacha”, com finalidade de divulgação publicitária do estúdio. Posteriormente, conquanto, por entender que a propriedade das fotos lhe pertencia, e não ao fotógrafo que as sacou, o estúdio de Brigitte acabou por ceder os direitos autorais das fotografias objetos da lide, ao músico Marcos Viana, e à empresa, Sonhos e Sons Ltda., que utilizaram as imagens na confecção de três CDs de grande repercussão nacional: “Danças do Ventre de ‘O Clone’”, “Jihad Akel – The Magic Arab Violin” e “CD oficial da novela ‘O Clone’”.
Ao julgar o caso, em primeira instância, o Magistrado da 30ª Vara Cível de Belo Horizonte, Geraldo David Camargo, condenou a empresa e o músico a pagar R$ 2,5 mil ao fotógrafo, referente ao dano moral devido a ausência de créditos nas imagens. No mais, ou seja, no que tange a possibilidade de cessão não autorizada da obra fotográfica para terceiros, entendeu o Tribunal que “se o autor já foi remunerado pelo serviço que prestou, não pode pedir nova reparação material”.
Em segundo grau de jurisdição, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, no mesmo sentido, acordou que “o fotógrafo contratado para registrar festividades ou eventos, notadamente se subordinado às coordenações do contratante, não é titular dos direitos autorais das fotografias colhidas, pois nada expressou, apenas cumpriu ordens e prestou os serviços para os quais foi contratado”.
Todavia, conforme é cediço, a decisão em tela destoa da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que, em caso análogo –
REsp 1034103 / RJ, DJe 21.09.2010 -, já decidiu “que a fotografia é obra protegida por direito do autor, e, ainda que produzida na constância de relação de trabalho, integra a propriedade imaterial do fotógrafo, não importando se valorada como obra de especial caráter artístico ou não” [2].
Neste mesmo julgado, os Ministros acordaram que “o empregador cessionário do direito patrimonial sobre a obra não pode transferí-lo a terceiro, mormente se o faz onerosamente, sem anuência do autor”.
Aliás, o desacerto da decisão do TJ/MG resta evidente, na medida em que a questão acerca da impossibilidade da cessão não expressa dos direitos autorais advinda pela simples existência do contrato de trabalho não é nova nos Tribunais pátrios, já tendo sido objeto de outros julgados, como é o caso do REsp 121.757, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 08.03.2000.
NOTAS:
[1] TJ/MG, 10ª Câmara Cível, Apelação Cível 1.0024.08.122424-8/002, Des.(a) Gutemberg da Mota e Silva, DJe 11.02.2014: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZAÇÃO – DIREITO DO AUTOR – FOTOGRAFIAS – CRIAÇÃO DE ESPÍRITO – OBRA ARTÍSTICA – DIREITO DE USO. – O direito autoral deve ser reconhecido a quem realmente manifestou uma criação do espírito, decorrente da sua criatividade, talento, sensibilidade. O fotógrafo contratado para registrar festividades ou eventos, notadamente se subordinado às coordenações do contratante, não é titular dos direitos autorais das fotografias colhidas, pois nada expressou, apenas cumpriu ordens e prestou os serviços para os quais foi contratado. – A reprodução de retratos, ou de outra forma de representação da imagem, feitos sob encomenda, não constitui ofensa aos direitos autorais quando realizada pelo proprietário do objeto encomendado (art. 46, I, “c”, da Lei nº 9.610/98). – Recurso não provido.
[2] STJ, REsp 1034103 / RJ, Ministra Relatora NANCY ANDRIGHI, Ministro Relator do Acórdão SIDNEI BENETI, T3 – Terceira Turma, DJe 21.09.2010: DIREITO AUTORAL. FOTÓGRAFO CONTRATADO. RELAÇÃO DE TRABALHO. PROPRIEDADE IMATERIAL INALIENÁVEL DAS FOTOGRAFIAS. NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO DO AUTOR DA OBRA PARA A PUBLICAÇÃO POR TERCEIROS. DESNECESSÁRIA A CESSÃO, CONTUDO, PARA A PUBLICAÇÃO PELO PRÓPRIO EMPREGADOR. I – A fotografia é obra protegida por direito do autor, e, ainda que produzida na constância de relação de trabalho, integra a propriedade imaterial do fotógrafo, não importando se valorada como obra de especial caráter artístico ou não. II – O empregador cessionário do direito patrimonial sobre a obra não pode transferí-lo a terceiro, mormente se o faz onerosamente, sem anuência do autor. III – Pode, no entanto, utilizar a obra que integrou determinada matéria jornalística, para cuja ilustração incumbido o profissional fotógrafo, em outros produtos congêneres da mesma empresa. IV – Recurso Especial provido.
*Ilustração de banco de imagens gratuito
Maurício Brum Esteves