quinta-feira, 4 de abril de 2013

As patentes na indústria farmacêutica: entre a inovação e a saúde pública


*Artigo publicado em: http://www.piccininiserrano.com.br/blog/

As patentes na indústria farmacêutica: entre a inovação e a saúde pública



No mesmo sentido de outro estudo lançado em fevereiro de 2013, pela Organização Mundial do Comércio (OMC), em parceria com Organização Mundial da Saúde (OMS) e Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), denominado “Promovendo Acesso a Inovação e Tecnologias Médicas: intersecções entre saúde pública, propriedade intelectual e comércio”a Universidade de Chicago divulgou, em março de 2013, um estudo que questiona a utilidade dos direitos de propriedade intelectual como mecanismo de incentivo à inovação e ao desenvolvimento tecnológico.
Sob o título, “Do Intellectual Property Rights on Existing Technologies Hinder Subsequent Innovation?” [1], a Universidade de Chicago publicou um estudo que sugere que alguns tipos de direitos de propriedade intelectual, ao invés de servir como mecanismo de incentivo à inovação e ao desenvolvimento tecnológico, como se era de esperar deste tipo de relação jurídica que envolve a concessão de direitos de exclusividade para inventores e criadores, acabam por desencorajar posteriores pesquisas científicas.
Conforme assevera o autor do estudo, Heidi Williams, o objetivo dos direitos de propriedade intelectual – como o sistema de patentes – é o de fornecer incentivos para o desenvolvimento de novas tecnologias. No entanto, nos últimos anos, têm-se percebido que as patentes podem estar causando efeito reverso, desestimulando pesquisas científicas que estão baseadas em inovações protegidas por Direitos de Propriedade Intelectual [2].
Williams investigou o sequenciamento do genoma humano, tanto pelo prisma do Projeto Genoma Humano, colocado em domínio público, quanto pelas pesquisas promovidas pela empresa privada Celera, cujos resultados foram protegidos por Direitos de Propriedade Intelectual, com direito de exclusividade de dois anos, demandando licenciamentos específicos baseado em contrato, com previsão de elevadas quantias em royalties.
Ao examinar o grau de investimento subsequente em pesquisa científica para desenvolvimento de produtos com cada gene protegido por Direito de Propriedade Intelectual pela empresa Celera, Williams Heidi constatou uma redução de 20% a 30% nas pesquisas científicas posteriores, o que indica um desestímulo ao desenvolvimento de produtos para esses genes protegidos pela propriedade intelectual da Celera.
O autor do estudo conclui, através destas evidências que, ao menos em uma análise preliminar, os direitos de propriedade intelectual podem representar custos substancialmente elevados para futuras pesquisas, o que acaba por representar um obstáculo à inovação e ao desenvolvimento tecnológico.
O que se percebe, com bastante evidencia, através destes recentes estudos, é o acirramento das discussões envolvendo a concessão de Direitos de Propriedade Intelectual (patentes) para medicamentos e produtos farmacêuticos.
No Brasil, até o ano de 1996, os medicamentos e produtos farmacêuticos não podiam ser protegidos por patentes, conforme a legislação da época. Entretanto, com o advento da última rodada do GATT, no ano de 1994, também conhecido como “A Rodada do Uruguai”, foi criada a OMC (Organização Mundial do Comércio), e pactuado o Acordo TRIPS – Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights -, cuja conclusão deu-se em 1995, procedendo-se uma revisão das legislações nacionais dos países em desenvolvimento, com o intuito de aumentar a proteção à propriedade intelectual, sob o argumento de proporcionar maior estímulo ao desenvolvimento tecnológico e à inovação.
Após ratificar o acordo, o Brasil promulgou, em 1997, a fim de se adequar ao TRIPS, uma nova Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/ 96), a partir da qual as invenções farmacêuticas tornaram-se objeto de propriedade exclusiva dos detentores das patentes.
Desde então, as discussões envolvendo o constante conflito entre os Direitos de Propriedade Intelectual e o Direito à Saúde apenas se acirraram, dando ensejo, por exemplo, as extensas discussões acadêmicas envolvendo a licença compulsória de medicamentos, bem como as indagações sobre: em que medida a concessão de Direitos de Propriedade Intelectual realmente incentiva a inovação, ou, apenas, obsta o acesso da população a medicamentos, extremamente onerosos, e dificulta o acesso à saúde?
Independente da resposta para a celeuma, que, data máxima vênia, ainda não apresenta seguros resultados, o que se percebe é que estas recentes pesquisas acrescentam um fator, até então desconhecido, principalmente no que tange aos Direitos de Propriedade Intelectual para medicamentos. Afinal, se inexiste incentivo à inovação, o ânimo de se assegurar exclusividade aos inventores se esvai, perdendo qualquer sentido sua concessão para privados, se não asseguram benefícios coletivos.
[1] Tradução livre: “Os Direitos de Propriedade Intelectual prejudicam a inovação futura”.
[2] Original: “The goal of intellectual property rights – such as the patent system – is to provide incentives for the development of new technologies.  However, in recent years many have expressed concerns that patents may be impeding innovation if patents on existing technologies hinder subsequent innovation”.
Fonte da pesquisa:
http://press.uchicago.edu/pressReleases/2013/March/1303jpeWilliams.html
*Redigido por Maurício Brum Esteves

*Artigo publicado em: http://www.piccininiserrano.com.br/blog/



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