A Comissão Parlamentar de Inquérito dos Crimes Cibernéticos
apresentou no final de março seu Relatório Final, com uma série de
propostas e de Projetos de Lei (PLs) que terão prioridade na Câmara dos
Deputados. Entre as justificativas da CPI estavam o aumento de 192,93%
nas denúncias de websites envolvendo suspeitas de tráfico de pessoas de
2013 a 2014 e prejuízos de US$ 15,3 bilhões com crimes cibernéticos no
Brasil em 2010. Os encaminhamentos finais sugeridos por essa Comissão
Parlamentar foram recebidos com preocupação pela comunidade jurídica.
“São reflexos de práticas adotadas em períodos antidemocráticos e que
têm pouca relação com a proposta democrática da Constituição de 1988”,
afirmou Maurício Brum Esteves, sócio de Silveiro Advogados.
Um dos pontos mais polêmicos do Relatório Final é o 5º PL, que
pretende alterar o artigo 21 do Marco Civil da Internet, por meio do
artigo 21-a, cuja principal determinação é a remoção rápida, sem
necessidade de decisão judicial, de conteúdos que violam a “honra”. É
uma alteração do objetivo original de impedir a circulação na Internet
de crimes sexuais ou da exposição indevida da intimidade das pessoas,
como nos casos de revenge porn.
Os autores do artigo 21-a justificam a mudanças pelos supostos danos
irreversíveis que os crimes contra a honra praticados nas redes sociais
podem ocasionar, em razão da “viralização” dos acontecimentos. A nova
redação afirma que políticos podem ser “vítimas” desse crime, pois uma
eleição é influenciada por possíveis campanhas difamatórias veiculadas
na internet. Por isso, a demora na remoção dessas informações poderia
resultar em prejuízos à democracia. Na opinião de Esteves, o efeito
imediato desse projeto de lei é a censura. “Em um período eleitoral, a
consequência da alteração pretendida por este PL será a de que todo e
qualquer comentário contrário aos políticos será imediatamente retirado
pelos provedores de aplicação, sob pena de que os próprios provedores
sejam subsidiariamente responsabilizados”, explicou.
O artigo 21-a vai mais além e pode obrigar os provedores a fiscalizar
frequentemente o conteúdo dos sites. Esteves comenta que o objetivo
desse PL não é o de simplesmente criar um meio para a retirada de
conteúdo sem ação judicial. Isso porque os provedores já costumam
excluir conteúdo ilegal ou contrário aos Termos de Uso e Políticas de
Privacidade de seus sites, espontaneamente ou por meio de uma simples
notificação. “O PL pretende criar um meio coercitivo para obrigar os
provedores a retirar conteúdo considerado ofensivo, colocando-os com
responsabilidade solidária caso a retirada não ocorra em 48 horas, sem
qualquer exame de mérito”, disse Esteves.
Bloqueio por ordem judicial
O artigo 9º do Marco Civil da Internet determina a neutralidade da
Rede, ou seja, que os pacotes de dados trafeguem de forma isonômica, sem
qualquer distinção ou preconceito. Por isso, as operadoras de conexão
não podem otimizar a capacidade da banda em face de aplicações mais
demandantes, nem podem examinar o tráfego de dados dos usuários para
tornar certas aplicações gratuitas e outras extremamente caras.
Segundo o especialista, a neutralidade da Rede pode ser duramente
atingida, caso seja aprovado o 7º Projeto de Lei proposto pelo Relatório
Final. Ele possibilita o bloqueio de aplicações de Internet por ordem
judicial, sempre que essa medida for implantada para coibir o acesso a
serviços considerados ilegais no curso do processo judicial. Houve
recentemente um exemplo, quando o aplicativo WhatsApp foi bloqueado e o
vice-presidente do Facebook na América Latina, empresa proprietária da
marca, foi preso. Foram decisões arbitrárias e, como tais, modificadas
em segundo grau, diz Esteves. “Mas se esse PL for aprovado, qualquer
juiz do País poderá bloquear um aplicativo de mensagens amplamente
difundido e utilizado pela população brasileira, não só como meio de
comunicação, mas também como de trabalho, e mandar prender o
administrador da empresa, em tese, responsável pelo cumprimento da ordem
judicial”, considerou o advogado.
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